samedi 30 juin 2018

Energia partilhada

Enquanto a França jogava contra a Argentina, a bola rolava no gramado do Parque de Sceaux. Aniversário de amigo conta mais do que jogo de Copa do mundo. Para o time dos 11 amigos, a bola colorida sob o sol escaldante era revezada com a batalha de pistola de água que garantia o frescor.
Decidi dar uma olhada no resultado após meia hora de jogo. Quando informei o 1a 0 do momento, à favor da França, gritaram correndo espalhando a notícia aos amigos. A bola ficou leve no pé da maioria, só um deles estava torcendo para a Argentina. Alguns minutos depois o placar se invertera, e a decepção apareceu nos rostinhos transpirados. De repente, percebi que outros pequenos grupos sob as sombras das cerejeiras acompanhavam o jogo e os gritos iam anunciando os gols, como se naqueles 90 minutos todo o gramado estivesse na mesma energia. E a cada sinal de euforia eu corria ver no celular, até o momento que o sinal de internet sumiu, aos 70 minutos, quando já estava 4 a 2 para a França, para a alegria dos pequenos que ainda corriam com a garra dos que estão à frente no placar.
Jogo terminado, a internet volta, felicidade total que se espalha sob as árvores e no coração dos franceses e estrangeiros que só esperavam por isso... e que vão chorar quando verem o gol do Pavard !

vendredi 29 juin 2018

Uma criança e seu instrumento

Ele decidiu tocar. Então hoje foi o dia que fui levar o contrabaixo na escola pro Iago tocar para os colegas. Preparou algumas partituras, algumas músicas conhecidas, outras nem tanto... Acho que eu nunca o vi tão relaxado com seu instrumento. Apresentou cada peça, explicando a finalidade, detalhes precisos, íntimos, adquiridos da proximidade de tantos anos. Tocou as músicas que apresentou no exame, depois tocou Star Wars, Piratas do Caribe e La Truite de Schubert.
Os que se interessaram se aproximaram, queriam saber do arco, das crinas de cavalo, ele explicava empolgado e concentrado, quase como se fosse sua profissão. Assustei, será que não passamos o carro na frente dos bois ?
As mãozinhas se revezavam na madeira doce do instrumento, pra sentir a vibração. Boquiabertos, registravam as novas impressões, o som grave, o mais grave que já escutaram. Feito a voz profunda dos cantores tibetanos que ressoam dentro da gente.
E lá fui eu, de volta pra casa, carregando aquele peso. Peso que vale; que vale a pena o sacrifício de transportar, subir e descer escadas, transpirar. Peso que acaba sendo leve depois de testemunhar essa aproximação verdadeira de uma criança e seu instrumento.




jeudi 28 juin 2018

Lição das flores

Me vejo em encantamento. Emocionada pelas flores que me rodeiam nesse momento, sem entender muito bem o porquê. Primeiro foram os coquelicots que me surpreemderam pela delicadeza das pétalas e vivacidade das cores. Depois foram as flores rosas das suculentas, de uma simetria impressionante. Nessa última semana, descobri um girassol que nasceu sozinho na minha floreira. Vi aquele tronco crescendo, intrigada, naquela pouca terra...pensei, é mato, logo morre sozinho. Mulher de pouca fé...ele cresceu, atingiu um metro e floresceu naquele amarelo ouro para louvar o sol. Abelhas e formigas, percevejos minúsculos se banham no seu pólen, e perpetuam o ciclo da vida. Não tê-lo arrancado foi uma sorte : uma lição de paciência, e a recompensa de vê-lo florir.

Tem algo de milagroso me encantando em cada canto. Quando fui à horta pela manhã, uma linda flor de abóbora estava aberta. Mais cinco vão abrir. As flores macho podem ser comidas em tempura, mas devemos deixar ao menos uma para fecundar a fêmea e gerar frutos. Nada mais justo...
Ao entardecer ela havia fechado. Teremos tempura de flor amanhã, sem para tanto impedir a abóbora de nascer, crescer e atingir sua maturidade. Assim como os legumes,  os pais se vão, os filhos ficam, se tornam flores e frutos, dando continuidade ao milagre da vida.

mercredi 27 juin 2018

Partida vitoriosa

Pra quem não estava empolgada com a Copa, até que estou tendo surpresas interessantes. 
As culturas são tão diferentes, e ao mesmo tempo transparentes, evidentes nas posturas dos jogadores em campo.
A Coréia da minha amiga Myung-soo, possui as mesmas expressões que ela. Quando ela se preocupa com o resultado do filho, e eles com um gol perdido. O gestual é o mesmo : na preocupação, com os olhos cerrados e ao longe; e na realização, no sorriso escancarado, coisa rara nessa cultura contida. Comemoraram a vitória como se tivessem levado a taça, apesar de estarem indo embora. Escorregando com a bola, conseguiram impedir a Alemanha de marcar.
Ah, a Alemanha...tão sóbria e competente, falhou. E mesmo vivendo a emoção da derrota, não pareciam ainda acreditarem no acontecido. A emoção ainda não alcançara a compreensão intelectual, e lá foram eles, embora, meio confusos. O goleiro deu uma entrevista com uma lucidez e humildade exemplares, mesmo sem entender o que acontecera. Ah, meus caros, vocês estavam ansiosos, e esse tipo de emoção atrapalha. Minha amiga alemã deve estar tristinha hoje, força minha linda, há dias para todos...
Acho que os jogadores ainda estão longe de sentir um décimo do que o povo brasileiro sentiu naquele 7 a 1, que tirou o chão de muita gente. Mas hoje tocaram uma rara emoção, que ela tenha traçado um certo aprendizado...

mardi 26 juin 2018

Cuidado e necessidade

Cuidar. Mas de quem precisa. Quem precisa ? Quem se sente incapaz de fazer algo, tem consciência disso e pede ajuda. Como ajudar ? Executando aquilo que a pessoa realmente não seja capaz de fazer. O resto é abuso...
Como saber se minha ajuda é válida ? Como não ultrapassar o limite da minha vontade de fazer, respeitando aquele que precisa que eu faça ?
Estar aberto, exercitar a escuta, não só do que é dito, mas também do não dito. Quantos gestos já não dizem tudo ?
Necessidade. A ajuda é uma necessidade do outro, se não for não é ajuda, é folga.
Filhos precisam de ajuda dos pais enquanto bebês, naquilo que não conseguen fazer sozinhos. A partir do instante que isso acontece, a autonomia não é só bem-vinda, como imprescindível. Ali se constrói a confiança em si mesmo.
Idosos precisam de ajuda naquilo que não são mais capazes de fazer sozinhos. E se sentirão confiantes se compreendermos a importância do gesto preciso,  do gesto como se fossem eles que fizessem; nesse instante o meu "saber" passa a respeitar o "saber" do outro pelo ato. Ato vivido junto, que fala de uma relação : de respeito àquele que é, e do respeito àquele que um dia virei a ser.

Foto : Maraú 2013 " Segura forte na minha mão, pode apertar se quiser subir"

lundi 25 juin 2018

Tempo de fogueira

Ontem me vi entre fogueiras, caipiras e perfume de milho. Imagens, vídeos, as crianças crescem e a bandeiras de festa junina continuam com a mesma forma. Colávamos as nossas com cola de farinha feita pelo meu pai, parecia mágica ! Os vestidos com a mesma renda que raramente combinava com a estampa xadrez do vestido. As camisas de flanela com os jeans furados, que estão tão na moda ultimamente...
Eu tinha uma amiga que era transformada pela mãe nessa época. Eu achava bonito a pinta única que a mãe dela fazia estilo Cindy Crawford, e das suas tranças longas. Tudo bem que ela não parecia com uma caipirinha como eu, com minhas marias chiquinhas e a cara enfestada de pintinhas... mas hoje vejo que ela ficava sensual demais pra sua idade...
Não gostava de quadrilha, mas dançava, visto que eu não sabia dizer não. Gostava mesmo da pescaria e do correio elegante...nunca tive coragem de enviar, mas adorava escrever o dos outros, acabava por saber de todos os romances em curso, os secretos e os revelados.
Conforme fui crescendo e as quadrilhas desaparecendo, passei até a ser presa na cadeia ! Eu gostava, queria dizer que alguém pensava em me prender...
Na idade em que a gente passa despercebido, a cadeia de festa junina é a maior glória !
Quando chegou a vez dos meus meninos, gostava de caprichar na barba, o equivalente às minhas pintinhas de menina, e mais ainda de ficar com eles perto da fogueira, ouvindo aquele crepitar inesperado, sentindo aquele perfume de madeira queimada, que impregnava na roupa da gente. 
O tempo cuida para que o paladar espere junho para saborear as especiarias do vinho quente, para comer com gosto uma pamonha caseira. O tempo cuida para que todas essas lembranças não se percam nas profundezas da gente, para que elas emerjam ao menor sinal, trazendo o gosto simples desse tempo. Das fogueiras que ainda espero fazer, o meu tempo dirá qual será a última.

dimanche 24 juin 2018

Vencer junto é mais gostoso

Assistindo um lance de gol do Japão na manhã de hoje, lembrei porquê gostava de futebol.
Quando eles cedem à própria sede de gol pra aumentar a sua possibilidade, e a bola se cruza das maneiras mais improváveis, um desenho se traça por alguns segundos, e quase uma dança se forma. Vários lances guardam essa beleza ainda mais profunda, se olharmos mais de perto...
Naqueles segundos finais em direção ao gol,  quando um jogador já recebeu um passe de outro, e que ele faz a escolha de dar continuidade ao lance passando a bola para outro que está numa posição mais favorável que a dele, ele deixa de ser egoísta por alguns segundos...ele coloca a equipe à frente da própria "glória" individual. E a beleza está nesse gesto, no coletivo que passa à frente do individual.
Outro momento que me tocou foi a dos garotos da Inglaterra combinando a jogada da falta. Eles ficaram lá, cochichando por alguns instantes, que nem crianças que combinam as estratégias para ganhar uma brincadeira. E não é que deu certo ? O jogo ensaiado com a leveza de um nado sincronizado, arrancou sorrisos de todos eles, como das meninas que sobem e descem dentro da piscina.
Não é que as emoções e a beleza do esporte coletivo ainda transbordam na paixão pela bola desses meninos ? Quando se abraçam na energia transbordante, dá pra se emocionar com eles... Quando estão juntos, determinados a alcançar um mesmo objetivo, tudo pode acontecer...


samedi 23 juin 2018

Os outros não nos devem nada

Como eu, outros novatos tiveram sua parcela na horta esse ano. Minha vizinha da direita, vem pouco mas é sempre aberta e disponivel. Dei a ela dois pés de tomate que estavam brotando no meio da minha parcela. A da esquerda é professora na antiga escola do Iago, dela ganhei um pé de abobrinha e outro de pimentão. Tem um casal de indianos que fala pouco, bem na minha frente, cuidam bem do seu canto, de terra fofa e úmida. Uma senhora asiática um pouco mais longe também passa horas ali. A troca é natural entre os antigos que lá estão e os novatos no pedaço. Mas nem com todo mundo...
Enquanto eu limpava um espaço para plantar novos pés de pepino, uma moça me chamou a atenção. Ela perguntava a Fabien o que eram as plantas de sua parcela. Com um ar ligeiramente mal humorado, se perguntava o que fazer disso e daquilo, querendo trocar aquilo que tinha herdado do ocupante anterior. Até aí, ela tem todo o direito. Em seguida vai até a estufa pegar algumas mudas disponiveis e pergunta ainda o que são. Tudo bem, ela acabou de chegar e não é obrigada a conhecer as plantas, mas um ar ranzinza impregnava sua voz. Queria gravetos longos para servir de suporte ao seu pé de vagem. Fabien cortou um pedaço do pinheiro para criar dois pedaços pra ela. Na hora de colocar na terra, ela faz tipo que não sabe. Ele vai lá e explica, acaba fazendo por ela. Enquanto isso outra senhora procurava um pedaço de barbante para amarrá-los um ao outro. Nada disso teria me incomodado se não fosse o tom de imposição da sua voz, como se todos lhe devessem algo; dificil explicar...
Dificil entender também que todos se arranjavam a encontrar formas de satisfazer seus pedidos. Senti um abuso de sua parte... como se não houvesse disposição nenhuma aberta à troca, fundamental num espaço como esse.
As ervas daninhas me pareceram pouco nocivas perto da atitude da moça que se fazia servir pelos outros. Tomara que seu pedaço de terra a comova, que ela se torne mais sensivel e deixe de achar que as coisas devem chegar até ela, que aprenda a ir, ela mesma, atrás daquilo que quer. Ou, pelo menos ser grata pelo que recebe...

vendredi 22 juin 2018

Meninos em campo

Hoje eu não vi o jogo do Brasil. Ouvi. Duas horas da tarde, hora da faxina. O aspirador cobria um pouco o som da TV, mas eu via a movimentação quando passava pela porta da sala. Quando terminei o aspirador,  não mudou grande coisa...meio do primeiro tempo, os narradores franceses que já são naturalmente discretos, em silêncio. Quem chegasse de fora acharia que eles estavam ganhando de 5 a 0... bate bola tranquilo rolando, que nem pelada de domingo depois do churrasco bem regado...
O tempo foi passando, e os lances aumentando. Sentia uma ligeira empolgação nas vozes dos narradores, mas nada se efetivava. Eu passava o pano tranquila ,  o coração nem acelerava. Aconselho uma boa faxina para os mais nervosos durante o jogo : distração garantida, o corpo tem mais o que fazer e nem se preocupa com o que os outros fazem com seus próprios.
E fazem muitas coisas por sinal, uma dança cheia de velocidade e alguns tombos, entremeado de troca troca de bola, como quando jogamos no parque no fim de semana.
Precisaram afichar o tempo adicional para a coisa acontecer, pra concentração ultrapassar a tensão e permitir a precisão. Ai ai, esses meninos quase irresponsáveis, me fizeram lembrar meus meninos indignados um com a vitória do outro. Tá na hora de assumir a fundo essa responsabilidade, para poder continuar avançando, sem angústia, mas com o justo rigor.



jeudi 21 juin 2018

A força vem das sombras

A orquestra a cordas desse ano teve uma cor particular... O percurso das músicas escolhidas era um pouco sombrio, indo de sons mais graves e um tanto introspectivos, à composições dramáticas como a da Lista de Schindler e do Senhor dos Anéis, onde Iago foi um dos acompanhantes com seu contrabaixo.
Um dos compositores da noite foi Dimitri Chostakovich. Uma das músicas da primeira orquestra foi composta num momento que ele se preparava para dar adeus à sua vida. Durante um ano crianças de 9 anos trabalharam uma obra que transformou a angústia em beleza, a incerteza do amanhã em emoção. Fiquei ali imaginando o tamanho da força desse compositor em expressar a realidade diante de um possivel momento de desespero, e me encho de esperança querendo crer nessa nossa capacidade também. Sim, da dor pode nascer esplendor, da angústia, o grito de tocar o fundo do poço, tomar impulso e sair reconstruído. Não por fugir dele, mas exatamente por tê-lo tocado.
Que consigamos compor, diante de todo nosso barulho interno, esse som de lucidez.



mercredi 20 juin 2018

Verão chegando no prato

Estava ansiosa pela chegada dos legumes de verão. A mistura de cores, o perfume da abobrinha que pede o tomilho, um molho de tomates frescos que pede o manjericão. O casamento das ervas com os legumes é natural, é esperado e traz o frescor que o verão precisa.
Já gostava de ratatouille, mas depois do desenho, que valoriza a paixão de Remi pelo encontro dos sabores e perfumes; realizá-lo é um convite à poetizar. O prato que conquista o crítico por levá-lo de volta às deliciosas lembranças de infância já faz parte da nossa curta memória de dez anos de França. Não sei desde quando preparo, mas gosto de mergulhar os tomates em água fervida para a pele sair sozinha, sem perder nem um pedacinho de carne. Gosto de cortar as abobrinhas e as beringelas pequenininhas, de refogá-las separadamente e ainda crocantes, colocá-las no molho de tomate que está ao lado, fervendo devagarinho. Daí falta pouco para ficar pronto, são o perfume e a consistência que anunciam o momento.
Verdade que a original demora mais, vai ao forno, existem um tanto de receitas para o número de familias francesas... a minha não é, pois a autentifiquei ao meu modo.
O que sobrou mal cobre o fundo da panela, e foi só o primeiro da temporada...com legumes ainda com pouco gosto, pois ainda não se expuseram suficientemente ao sol, o rei que regula sabiamente o que colocamos em nossos pratos.


mardi 19 juin 2018

Integrar-se sem abandonar-se

Depois do terceiro filho, acabei me acostumando a enfrentrar situações inusitadas que exigem certo reflexo e sangue frio. Decepções onde dei uma força, encrencas onde passei muita raiva, mas briga é a primeira vez...
Observava a recreação do almoço na escola do Iago. Tinha um horário com a professora para pegar o boletim. Lá estava ele, correndo pra cá e pra lá. De repente segura um meninoö pelo pescoço meio agressivamente. Me aproximo do vidro, vejo que o outro ri e logo escapa. Tenho frio nas espinhas dessas brincadeiras que beiram o limite da violência...
Em seguida, ele arrancou o boné da mão de outro. Ajeita o boné e coloca na cabeça do amigo, que o chama todo fim de semana pra ir a sua casa. Brincam com gravetos, dai saio andando pelo corredor, já imaginando coisas que podem acontecer...
Minutos depois acenam pra mim. Vejo que Iago está num canto chorando. Desço num piscar de olhos. Com o consentimento dos adultos que assistiram a cena, o recebo em meus braços. Calma, pra que ele fique calmo. Respira, e ele respira fundo soluçando. Explica que defendeu o amigo. A moça que assistiu a cena diz que entende que ele tenha se defendido, mas que ele não precisava ter xingado o outro. Ele solta que o outro o chamou de cachorro - pego suas bochechas dizendo que não é grave ser chamado assim - ele esboça um sorriso, respiração acalma, mais dois abraços que acalentam o nervosismo e ele volta pro recreio.
Na reunião, a professora diz que os alunos mais calmos se deixaram levar pelo clima da classe, e acabaram sendo vencidos pela agitação contagiante, que com o calor, vira uma mistura explosiva. Finalmente, diz ela, ao menos eles estão integrados. Verdade, mas a que preço ? ... Cruzo com ele na saida, mais um beijo pra que sua tarde seja leve e a minha curta, e a gente se veja algumas horas depois.
Sem retomar o assunto, ele decidiu tocar seu contrabaixo para os amigos na semana que vem ; sem rancores, ele poderá deixar a eles um pouco da sua generosidade.

lundi 18 juin 2018

A gente dá voltas, e o essencial sempre volta

Depois da missa, festa de familia do grupo do escoteiro que o Iago faz parte. Primeira brincadeira, montar barracas ! Os grupos foram divididos : os que já tinham montado e os que não tinham (ou já não montavam há tempos...) Era o nosso caso...
Bastou me aproximar daquelas barracas canadenses que voltei à momentos deliciosos da minha infância.
Sei que essas memórias são alimentadas com muitas fotos que nos divertimos olhando nos almoços de domingo...mas a lembrança olfativa me levou imediatamente pro mato de Brasópolis. Lembranças vagas, mas acolhedoras. De momentos simples e gostosos. Do dormir juntinho na barraca, a sensação de segurança. Da expectativa da piscina ficar pronta pra gente brincar lá dentro até os dedinhos enrugarem completamente. A lona fazia as vezes de piscina, colocada no buraco previamente cavado pelos super papais. E a água ficava morninha com o calor do sol, e a gente brincava relaxada pois não precisávamos de mais nada...
O acampamento de verão que o Iago vai participar me fez reviver o gostinho da minha infância feliz, das coisas pequenas que pareciam tão grandes : a simplicidade à serviço do essencial ! Ducha de bacia, refeições partilhadas do preparo ao ato. Uma semana de vida próximo a natureza, sua força, sua doçura, ao pé da fogueira, escutar e receber. Que sorte ele poder viver tudo isso, que sorte ter a oportunidade de se aprofundar sobre seu papel no planeta. Quem sabe suas lembranças não terão o mesmo gostinho precioso que as minhas ?

dimanche 17 juin 2018

Como fazer papais ?

O padre da missa de hoje citou Stromae, cantor e compositor belga, que mistura hip-hop e techno. Achei incrivel abordar o Dia dos Pais na igreja, com uma frase forte de um cantor contemporâneo : "Todo mundo sabe como fazer bebês, mas ninguém sabe como fazer papais." Sair de uma imobilidade espiritual, com alegria e aproximação da sua criança. Sua, leia-se exterior, e sua, também interior. A minha criança interior saúda a sua criança interior. Será que o exercer a paternidade não tenha ligação direta com esse passo ? A parte mais pura e sincera do pai, que aprende a se exercer vencendo essa inércia natural; ajuda a construir a parte que virá talvez, um dia, a se exercer como pai - em seu filho.
Essa parte que brinca, que entra no jogo, que se comove com as vitórias e consola nas derrotas, esse pai que acrescenta de igual pra igual. Que não humilha, não exige, que chora junto.
Tá aí, ao alcance de todos. Basta sair da inércia habitual, quebrar os padrões, olhar a necessidade do filho que como homem soube fazer e como pai deve se esforçar a fortalecer.

samedi 16 juin 2018

De que vale a Copa ?



Algo foi acontecendo que me fez ficar indiferente a essa história de Copa.

Aquele som abafado do público, pano de fundo para o espetáculo, era música para os meus ouvidos. Hoje soa como um barulho desnecessário. Os rapazes milionários fazendo correr em campo seus corpos sarados e cabelos engomados não me interessam. Parece até que eles estão no lugar errado ?! E quando fingem estar machucados rolando na grama, me dá até vergonha alheia. Isso sem tocar no assunto da diferença salarial entre homens e mulheres...é, finalmente não tem nada que me atraia no futebol atual.

Algo aconteceu que me afastou da memória carregada de afeto, construída há quase quarenta anos. Da primeira que me lembro, foi na derrota do Brasil em 82. Estávamos em Angra, e meu pai se refugiara sob a árvore centenária do Parque das Palmeiras. Nos meus oito anos, fui lá ficar com ele, sem saber muito como consolá-lo, só com o sentimento de não querer deixá-lo sozinho na tristeza. Em 86, os jogos eram motivos de churrasco entre amigos, e nos meus 13 anos, era esse o motivo que mais me interessava. Em 90 não me lembro de nada, acho que o Brasil foi eliminado antes que eu me interessasse em torcer. O ano do tetra foi inesquecivel, pois pude ver a carreata dos jogadores em Recife, rodeada do povo em festa, como se os problemas deixassem de existir nos segundos em que eles cruzaram a avenida. E em 98, quase tive o Ariel antes do tempo...talvez isso explique sua paixão pelo esporte...

Nas últimas Copas, a vida ganhou mais peso e os jogos menos brilho. Prioridades surgiram, ao mesmo tempo que esse universo de vaidade se escancarou diante de mim, me afastando do sentimento de estar junto, numa mesma energia contagiante. Algo que era natural e leve desaparecera...

Amanhã não sei se meu coração baterá mais rápido, se chorarei no hino nacional. Talvez a preocupação com a realidade brasileira seja tão presente, que seja dificil atravessar a espessa camada de decepção. Nada impede que a emoção encontre uma fresta pra entrar e trazer essas memórias afetivas de volta...  quem sabe ?

vendredi 15 juin 2018

Sono repara dor ?

O sono é reparador ? Ou ele repara a dor ?  A gente definitivamente não tem controle nenhum sobre ele. Ele se impõe chegando inesperado; ou partindo nos momentos em que ele devia ficar. A gente vê ele chegar, mas não percebe quando está dormindo acordado.
Outro dia fui levar o Hec pro aeroporto as 4h30 da manhã numa boa. Disse a ele que ultimamente o sono não tem sido meu "truque". Virei piada...imagino o quanto dormir deve ser importante pra ele...
Tenho a lembrança de um sono precioso de quando trabalhava de manhã e estudava a tarde. O ônibus da Vila Mariana até a Praça Roosevelt era a minha salvação : encostava a cabeça na janela, e tirava uma bela soneca de uma hora. Delícia era abrir os olhos e ver que ainda estava na avenida Paulista ! Eita sono reparador ! Duro era quando eu não tinha essa oportunidade, pois o sono chegava na hora de assistir as aulas que eu mais gostava...
Mas comecei mesmo a dormir em todas as ocasiões que apareciam depois da chegada dos meninos. Ah, cada minuto de sono profundo tinha um imenso valor nessa época...
Hoje em dia ele tem me virado do avesso. As 4h30 ele fica mais leve e os pensamentos já ficam a vontade pra chegar com toda a bagunça costumeira, é o sono que repara a dor. Acho que devia anotar as idéias que vem claras nesses momentos, talvez sejam momentos de lucidez que não existem durante o dia. Quem sabe o sono se reaproximaria encontrando um espaço calmo pra se instalar. Quando acordo nos momentos que deveria estar dormindo,  o dia seguinte segue arrastado, esperando o momento dele chegar de novo, e fazer sua função diária de permitir ao corpo e a cabeça de se reestabelecer, de reencontrar sua energia para a próxima jornada. Quando durmo nos momentos que devia estar desperta, talvez esteja perdendo os momentos mais preciosos da minha vida...

jeudi 14 juin 2018

Ainda há luz

Assisti emocionada a esse dia histórico para as mulheres argentinas. Não sem um sentimento dividido, pela minha própria experiência de vida, mas carregado mesmo assim de um grande alívio pela mulheres. 
Até há alguns anos eu era totalmente contra, e se acontecesse comigo sei que não o faria. Mas entendo muito bem que as circunstâncias de vida das pessoas não são as mesmas, que acidentes acontecem sim, e muito mais frequentemente do que imaginamos. Nem vale a pena falar do peso que uma vida não esperada num momento inoportuno pode acarretar para a mulher.  Ela carrega dentro de si, ela se torna responsável por alguém que não fez sozinha, mas que a vida mostra, acaba criando só.
 Muitos ainda não conseguem imaginar a dificuldade de alguém que opta pelo aborto, e muitas vezes deixa a vida por isso. Opta não por escolha, mas por falta dela. Quem imagina a dificuldade de tomar essa decisão, sem nunca ter passado, não deveria nem opinar. A gente precisa parar de achar que sabe o que o outro sente na pele. E aceitar, o universo do outro em toda a sua complexidade. Talvez seja um bom espelho para o nosso próprio universo...
Que esse 14 de junho de 2018 seja um marco na construção da igualdade; dia em que muitas mulheres argentinas respiraram aliviadas por terem o direito de decidirem pelos seus corpos.

mercredi 13 juin 2018

Deixar se espalhar, colher o vier

Meus tomateiros estão gigantes. Depois de tempestade, dizem que vem a bonança... e lá a generosidade não tem limites.
Ouvi dizer que deveria ter. Que para ter bons frutos, deveria reduzir o número de troncos, gulosos de seiva, para ter menos tomates e de melhor qualidade. Se não fizer isso, provavelmente terei muitos tomates pequenos e de casca grossa...mas quem disse que quero cortar os galhos gulosos ? Eu quero é deixá-los se espalhar, encontrar com outras plantas do caminho, interagir. Quero um montãonde tomates para poder distribuir por ai. Se eu tiver só uns poucos, vou fazer o que ? Ficar admirando e depois dividi-lo pra familia toda ?  
Isso pode servir pro vinho e para os legumes, mas eu acho que a gente poda demais. Corta, sem nem saber até onde ia dar aquilo, a gente tem medo se deixar ir até o fim... 
Será que a vida não precisa dessa abundância, desse espalhamento ? Ocupar todos os lugares, seguir todos os rumos, até o fim. E depois colher os frutos que brotarem pelo caminho, sejam bons ou ruins. A gente vai ter que engolir de qualquer jeito, não é mesmo ? Que a gente engula com a consciência de ter colhido o que plantou.

mardi 12 juin 2018

Respeito & Amor

Hoje meu instagram estava inundado de casais. Dia dos namorados, dia de atualizar as declarações de amor, de relembrar os velhos tempos, e sobre eles construir novos.
Décadas de companheirismo festejadas com homenagens , encontros em luaus no ápice do romantismo, parceiros no surf e na vida,  príncipes e princesas que se descobriram adolescentes e ainda mantém a chama acesa. Casais que já perderam a conta, mas não deixam a data passar despercebida.
Mas o mais importante dessa história, é a torcida que eles não sejam namorados somente nesse dia. O desejo que o respeito, o companheirismo, a cumplicidade, a escuta, sejam alimentados a cada dia, onde exista o esforço de ambos os lados de construir mais do que se pode sonhar no dia dos namorados... 
Que o amor seja eterno enquanto dure !

lundi 11 juin 2018

Grãos de areia

Desde o inicio do ano letivo, a professora do Iago me fizera um convite. Durante uma reunião, sugeriu que o Iago trouxesse seu instrumento um dia pra escola, para que os alunos conhecessem o contrabaixo e que pudessem ouví-lo tocar. Tinha percebido que a maioria da classe mal conhecia música clássica, tampouco um instrumento como o contrabaixo. 
O fim do ano letivo está chegando, e pensei em lembrar a professora da sua proposta. A diretora me sugeriu de perguntar primeiro para o Iago se ele gostaria, o que achei muito sensível da parte dela. E o que parecia simples se mostrou bem mais complexo...
Iago se mostrou inseguro em tocar para a classe. Disse que iriam caçoar dele. Exceto um colega, que segundo ele, respeita igualmente um grão de areia e o presidente da República. Comecei então a tentar entender o por quê dessa possivel reação...
Entendo a preocupação da professora em apresentar os alunos à uma área que desconhecem. Mas, será que eles estão interessados ? Será que o hip hop, o rap, as músicas orientais que talvez escutem em casa, já não satisfaçam a sua vida cultural. A que ponto não estaria expondo o Iago, colocando-o numa posição diferente da deles, abrindo espaço para um distanciamento de um mundo que ele mesmo começa aos poucos a se abrir...
Confesso estar dividida, somos todos grãos de areia finalmente. Mas merecemos mais respeito que um Presidente da República...

dimanche 10 juin 2018

Uma unanimidade culinária

Uma das primeiras coisas que aprendi a fazer na cozinha foi uma Torta de Limão. A Pati tinha encontrado a receita numa revista, feito, e me transmitido o que eu viria a se tornar uma unanimidade.
Não me lembro quantas vezes fiz até escrevê-la no famoso caderno de receitas que ganhei da minha avó quando casei. Como ele me acompanhou até aqui, a receita criou asas.
Já contei que há algum tempo, virou o ícone criativo da dupla Roti & Iago. O chefe e o sub-chefe propõem a cada vez uma pequena variação da receita, acrescentando nozes ou amendoins na massa, ou transformando a cobertura em suspiros. Mas eu, quando faço, mantenho a velha receita do meu caderno, escrito com a minha velha caligrafia da faculdade. 
Hoje a casa estava cheia, e a torta pronta desde de manhã. Iago moeu os biscoitos enquanto eu batia a clara em neve, espremeu os limões e os misturou com o leite condensado...e eu ainda batia as claras em neve... O toque final foi dele, colocando a cobertura em forma de espiral que quase transbordou do prato. O crocante amanteigado da massa, o doce azedinho que segue, terminando na cobertura de textura aerada. Talvez seja esse encontro inesperado o segredo...
O fato de ser unanimidade fez surgir idéias: um Food truck de Torta de Limão, ou de estrogonofe, outra receita lendária por aqui. Jamais os dois juntos... causaria indigestão !
Nada como plantar sonhos que podem um dia criar raízes e brotarem...na região parisiense; não, ela é muito pequena pra mim...eu, um Food Truck, França afora. Quem sabe, quem sabe...

samedi 9 juin 2018

Horta que toma forma

Esperei o sol baixar pra ir regar as plantas da horta. Levei alguns bambús que comprei para os tomateiros, os reis da minha parcela de terra. Tive que tirar alguns galhos que sugam o tronco principal para deixá-los crescer mais fortes. A gente poderia fazer isso com a gente também : jogar fora todos os supérfluos que nos absorvem e ficar só com o essencial. Pena que não é tão simples assim.
Reguei a terra, e tentei afofá-la um pouco. Ela é muito argilosa, e apesar da mistura de terra e esterco de galinha, ainda não parece ideal para todo tipo de planta. A terra também tem seus caprichos.
As mudas de beterraba não vingaram, dos três pepinos, restou só o tronco de um, que fica protegido pela sombra de um tomateiro. As frustrações que fazem parte, oportunidades pra gente tentar entender aonde errou...
Plantei alfaces esses dias, fiz as mudinhas em casa e coloquei à disposição na mini-estufa da Horta. Acabei ganhando flores e mudas de couve romanesco.
Todas tiveram que ser cobertas por garrafas cortadas e devidamente furadas, pra deixar as plantas respirarem, enquanto estão protegidas das lesmas.
Elas também reinam por ali, e se escondem durante o dia, na madeira úmida pra atacar as folhas que preferem durante a noite. Achei umas três que viraram aperitivo das galinhas. Elas vão muito bem, já me conhecem e cacarejam quando eu chego distribuindo cascas de melão e melancia cheias de restos. 
Descobri que tenho duas espécies diferentes de morangos, o selvagem que me agrada muito e os que a gente costuma comprar no supermercado, devorados pelos insetos que moram no meu pedaço. Não posso reclamar, deixo os grandes para os bichinhos e como aos poucos os minúsculos selvagens que são incrivelmente saborosos. 
Plantas que desconheço nascem de todos os lados, vindas com certeza pela alimentação das galinhas. Entre as surpresas vou desconfiando que terei melões, mais alfaces, tomates e talvez um bulbo de erva doce. Ah, os arbustos de framboesa que herdei também crescem a cada dia, talvez poderei ter frutos ano que vem.
As crianças que vem ajudar os pais a regar acabam se soltando completamente naquele pedaço rodeado de verde e passarinhos. Cantam, correm saltitando e rolam no chão. Talvez seja uma das poucas ocasiões que tem pra esse contato intimo com a terra, com a natureza. 
Assim como elas, sinto que preciso disso, tiro uns matos aqui e ali, toco a terra, sinto o cheiro; e me despeço do meu pedaço, deixando um pouco de mim naquela terra, e volto pra casa revigorada dessa troca.

vendredi 8 juin 2018

Diante da origem dos mundos

Mergulhei na história dos meteoritos na Grande Galeria da Evolução, no Jardin des Plantes em companhia da minha querida amiga Kathleen.
Esses pedaços misteriosos que caem do céu são muito mais do que simples pedras. Na verdade, descobri hoje que cada planeta, inclusive a nossa casa Terra, nada mais são que o conjunto de asteroides que se atrairam e se fundiram. Processo que levou milhares de anos, me pegou de surpresa como se de repente tudo fizesse sentido. E o deslumbramento que grandes e pequenas pedras que passariam ignoradas, fazem parte dessa esfera maravilhosa que a gente habita. Suspirei impressionada com esse milagre, não tem como não ser. Pois, mesmo cientificamente explicado, talvez por isso mesmo, por um instante toquei a preciosidade dessa beleza sem fim, das cores que a natureza criou, da precisão do funcionamento de tudo (ou quase tudo) que cobre essa grande massa de asteroides. E que a Lua nasceu da aglomeração dos detritos de um impacto de Marte com a Terra, há muito, muito tempo... aprendizados recebidos na escola, mas compreendidos só agora, com essa aproximação tão precisa e delicada da exposição. 
Um fato engraçado é que muitos homens negaram aceitar a existência dos meteoritos durante muito tempo...será que pressentiam a proximidade da descoberta das nossas origens ? Dos meteoritos puros, que formaram todos os planetas, aos meteoritos diferenciados, resultado da fusão térmica de um meteorito com as areias do Atacama, por exemplo; só podiamos admirar ...como crianças que descobrem as forças que nos cercam, deslumbradas, encantadas e certas que a ciência é lindamente misteriosa...




jeudi 7 juin 2018

Quantas coisas boas nos esperam !

Percorria a rua determinada, mas não completamente. Tinha que descobrir se o Iago tinha sido aceito na classe de música ou não. Não poderia continuar a sentir a dominação das minhas emoções mais um dia. Duas idas ao colégio, com as pernas bambas. Decido ligar pro conservatório. Só abre à 13h. Faço uma salada simples e leve. É só o que desce.
Por alguns instantes aceito esperar, não correr atrás, fugir da emoção aterradora e me instalar nessa conformidade de que o destino sabe o que faz...
Mas as 13h30, me digo que o que vida quer da gente é coragem, né não ? Ligo pro conservatório e a secretária vai tentar ver se o nome do Iago esta na lista.
Me lanço na faxina já prevista, sou apoiada por mensagens de amigas, que tentam me dar uma força. Como é maravilhoso ter apoio quando o chão parece tão desnivelado.
Eu, mando forte na faxina. Sentada no chão do banheiro, recebo o esperado telefonema. " Que des bonnes choses vous attendent " ela me disse, e chorei de alivio e felicidade. Alivio pelo percurso recompensado, o lindo caminho escolar, de mediador de conflitos, de belas notas, da capacidade de se integrar em outra cidade. De um esforço musical, participando de quatro cursos no conservatório, de fazer do conservatório sua segunda casa. Meu escoteiro musical me deu a mesma felicidade que o nascimento do Joca, se manifestando num choro que vai e vem. Mais uma emoção que se impõe, e que toma o comando até a rotina acalmar os ânimos. Emoção que dividimos hoje quando ele passou pela porta, num abraço de cumplicidade indestrutivel, que sempre existiu entre nós, que sempre será nosso porto seguro. A certeza de termos um ao outro.


mercredi 6 juin 2018

Longas horas virão

Sentada, balanço ao sabor do trem. Todo mundo entretido, ou em seus pensamentos, ou tentando escapar deles. Uns escutam música, outros jogam. A senhora à minha frente lê um livro com a Nossa Senhora na capa, e as vezes para pra olhar ao longe. Duas pessoas conversam atrás dela, sobre os colegas de trabalho.
Nem observando os outros meus pensamentos me deixam tranquila, então decidi escrever. Amanhã sai o resultado da entrevista do Iago, que contei dia desses. Acompanho dentro de mim o bate-boca que recomeça a cada dez minutos. Um lado, não se estressa, tem certeza que seu nome estará na lista, e quando ele relaxa confiante, o outro lado chega com tudo secando a minha boca e revirando minha barriga. Tenho a impressão que o primeiro é meu lado racional, que analisou o contexto e acredita; enquanto o segundo é emocional, e consegue alcançar uma fragilidade do meu temperamento.
A questão hoje é, como não me deixar levar pela empolgação do primeiro nem pelo desespero do segundo. Vou tentando, me afastando, como posso, de um e de outro, mesmo sabendo que eles voltam. Vou tentando ser simples, descer do trem agora esperando uma noite calma, como se não houvesse amanhã. E só de escrever sobre, me aprofundo nesse universo que eu sou e desconheço...

mardi 5 juin 2018

O que a vida espera da gente é coragem

Ela entrou no vagão lotado. Falando alto. Muitos faziam como se não existisse.
Disse ser SDF, sem domicilio fixo, insiste na vergonha, vergonha de pedir ajuda. Diz que não fomos ensinados a ajudar o outro, que nossos pais não nos ensinaram a estender a mão. Ela se inclui. Não consegue sair direito do lugar, tem muita gente. Continua falando, alto. Leio olhares aflitos ao meu redor, é dificil suportar a miséria esfregada na fuça.
Ela fala bem. Hesita em contar uma história, acaba contando. Recebera uma cotovelada em Invalides - não é ironia não - de um senhor, dizendo pra que ela voltasse de onde viera. 
De onde viemos, caro senhor, pensei comigo...enquanto a Africa foi interessante de colonizar, bem que vocês estiveram por lá, europeus civilizados. E quando pegaram tudo o que queriam, se mandaram e agora querem virar as costas, ignorar o que herdaram. Esse povo africano que fala francês tem como herança o direito a tentar a vida na França. É o mínimo, o mínimo.
Saiu do vagão com algumas moedas a mais, um sanduba e talvez um tic tac, que ela aceitaria como ajuda. Ganhou olhares e agradeceu a ajuda ajoelhando, desejando coragem; convidando a todos a visitar seu Senegal acolhedor e generoso. Dei meus sessenta centavos e meu olhar. 
Desejo a ela também, toda a coragem pra seguir em frente, pra não desacreditar na sensibilidade humana, não desistir.

lundi 4 juin 2018

Rumo traçado, rumo roubado

Pelo meu caminho acompanhei um trabalho lindo numa escola perto daqui.
Pouco a pouco, vários muros na área de recreação, começaram a serem trabalhados pelas crianças.
Vestidas com grandes camisetas manchadas de tintas, pintaram com grandes rolos de cabos longos todo o percurso do muro, de cores diferentes.
Dias depois, desenhos muito bem feitos começaram a aparecer. Percebi que dois adultos as guiavam nas pinturas detalhadas que exigiam bastante cuidado, nitidamente eram especialistas em grafite.
Hoje, o resultados. Entre as imagens sombreadas e de cores vivas, duas frases.
O quarteirão onde vivo participa de uma renovação. Onde antes haviam só habitações populares, foram contruidos imóveis privados para que ele passe a misturar classes sociais diferentes, nas escolas, centros de lazer e sociais e no comércio. Após uma longa campanha, a prefeitura conseguiu com o apoio popular,  a construção do primeiro Colegial Geral. Até hoje, só existem colegiais profissionalizantes. E isso pra mim é uma forma estranha de dirigir os estudos da população que mora aqui. Soa como se, por terem ajuda habitacional, estivessem automaticamente destinados a esse tipo de trabalho. Infelizmente, uma seletividade imposta desde cedo, minando a ambição e os sonhos daqueles que queiram ir mais longe. As crianças deveriam ter, ao menos, o direito de sonhar, e de acreditar que podem realizar seus sonhos, sejam eles quais forem. O Estado devia, ao menos, não impedí-las de dar grandes passos, o mais longe que pudessem, sem fechar portas, sem dirigir destinos. E não é bem o que acontece...
O trabalho dos grafiteiros era esse. Não deixar que elas esqueçam seus sonhos, que podem e devem persegui-los, que podem confiar nas ferramentas que possuem, apesar da sociedade dizer o contrário. Que elas acreditem em si mesmas e em suas capacidades. Algo vai sendo plantado, devagarinho...que sejam sementes de mudança...

As frases estampadas no muro :
"Donne de la couleur a tes rêves, pour dessiner ta propre histoire".

"Dê cor aos teus sonhos, para desenhar tua própria história".

"Soit une étoile rempli d'espoir".
"Seja uma estrela cheia de esperança".




dimanche 3 juin 2018

O músico e o cientista

Paris concentra mesmo alguma coisa de especial. Não é só no charme romântico que atrai os casais apaixonados, na arquitetura perfeita, nos monumentos a cada esquina. Ela abre portas para cientistas de lugares diferentes, e músicos talentosos vindos de longe.
E foi assim que hoje, reunimos duas gerações diferentes dos Aminos. O cientista e o músico.
O primeiro enchia o segundo de perguntas, e quando em seu francês iniciante, a palavra não vinha, ele soltava em japonês. Riso solto corria, dos dois sorrisos tão distantes e tão parecidos. 
Aos 17, o Amino músico veio pelo encorajamento de um professor que conhecera num estagio no Japão, que valorizou seu talento e o incentivou a vir estudar num conservatório parisiense.
Aos 43, o Amino cientista se encantava com o caminho percorrido pelo parente distante, e pelo seu apetite no almoço. 
Dividimos a mesa como se estivéssemos feito sempre, relembrando gestos de tomar missoshiro do Cinzo, dos gohas da Seiko, enquanto ele se reservia de arroz e costelinha...
Desdobrando as linguas e as pronúncias, encontrei um motivo de reencontro, propondo um passeio a casa de Monet, em Giverny. Ele aprendeu a admirar o pintor pela influência da namorada pianista, japonesa também. História que segue...
Dá pra não amar um lugar como Paris ? Ainda estou pra conhecer um lugar que reúna tantas condições para as pessoas buscarem seus sonhos antes inimagináveis, e se aventurarem nas suas buscas mais profundas...


samedi 2 juin 2018

Vestido na pele

O verão parisiense nem chegou, e já está um calorzinho gostoso...calor que convida os vestidos a aparecerem para vestir os corpos femininos. Hoje fiquei impressionada com a quantidade e variedade, nas ruas, eu mesma estava usando um... 
Estampas incriveis aparecem hoje em dia, algumas criadas por computador, outras enfeitando tecidos super macios, que contornam os corpos e valorizam todas as curvas. Até vi um cheio de babados que balançavam conforme a moça andava ! E tem também aquelas relíquias, de tecidos que não existem mais, herança de várias gerações.
Eu gosto de vestido por não me apertar e por poder sentir as pernas livres. Ele permite uma liberdade única, ainda mais quando é mais largo e permite que o ar circule. 
Não sei por que razão os homens também não experimentam, somente os escoceses conhecem a delicia de uma saia. Os outros não sabem o que estão perdendo...charme, liberdade e autenticidade. Pra toda idade, toda forma, todo o estilo, tem um vestido. Tem sensual, clássico, hippie. Tem feito em casa, comprado no brechó, presente que veio de longe. 
Meu trajeto no mêtro hoje foi assim, admirando as mulheres bem consigo mesmas em seus vestidos, na diversidade das formas, e alguns modelos ousados quebrando normas. Pois até usar um vestido pode ser liberador, num mundo ainda tão castrador.

vendredi 1 juin 2018

Nosso canivete interno

Ouvi hoje que precisamos todos de um canivete suisso. Assim, quando temos um problema pra resolver, a gente poderia tirá-lo do bolso e observar qual o melhor instrumento a utilizar. Temos tantos ! Todos aqueles do canivete ! Um deles certamente corresponderá ao que precisamos pra resolver, um deles com certeza ajudará a encontrar a solução.
Se a gente tá muito desesperado, fica dificil ter a visão clara e fazer a boa escolha. Temos que respirar fundo, dar um chega pra lá nos pensamentos confusos e deixar lugar pra uma inteligência limpa de emoção agir.
E se a ponta da chave de fenda não encaixa no parafuso, a gente vai devagarinho e pacientemente até conseguir. E se a tesoura perdeu o fio, a gente afia com que tem ao redor. E se o abridor de vinho está torto, a gente entorta a garrafa pra abrir. Mas se a tristeza bater, a gente saca a faquinha e encontra um graveto pra desfiar. E desfiando, vai sentindo o cheiro da madeira, cheiro de vida, e quando vê, a tristeza já se foi. Sem perder a fé, que as coisas se ajeitarão, que a gente não pode nunca esquecer somente uma coisa : que temos um belo canivete suisso dentro de nós.